A Regionalização do Espaço Mundial: da bipolaridade à multipolaridade

Unidade I - A Regionalização do Espaço Mundial:
da bipolaridade à multipolaridade 

A Regionalização do Espaço Mundial

 Uma das formas mais usadas para aprender Geografia é o estudo das regiões. De acordo com o geógrafo francês Vidal de La Blache (1845-1918), a região constitui uma unidade de análise geográfica que exprime a forma de os homens organizarem o espaço terrestre.
Assim, as regiões não são apenas um instrumento teórico de pesquisa, mas existem de fato, e cabe aos pesquisadores delimitá-Ias, descrevê-Ias e explicá-Ias.
De forma geral, regionalizar significa individualizar parte do espaço geográfico de acordo com determinados critérios, que podem ser sociais, culturais, físicos, econômicos e políticos. A regionalização pode também ocorrer em diferentes escalas: mundial, como a divisão do globo em dois hemisférios; nacional, como a separação territorial dos países; e local, como a delimitação de áreas específicas (a região central de uma cidade, por exemplo).
Nesta unidade estudaremos vários modos de regionalizar o mundo, com destaque as divisões políticas e socioeconômicas, todas resultantes de um processo histórico que moldou - e ainda molda - o espaço geográfico mundial.
A regionalização vem sendo estudada e proposta por muitos pesquisadores, com o objetivo, principalmente, de facilitar a análise do espaço geográfico. Ao dividir o espaço, ou fazer determinado recorte temático, é possível aprofundar o conhecimento sobre uma localidade, ou comparar diversas regiões, como nos mostra o geógrafo estadunidense Richard Hartshorne (1899-1992).
Richard Hartshorne
A partir da década de 1930, com a preocupação de estudar deta1hadamente aspectos particulares do espaço geográfico, tornou-se mais comum fazer divisões temáticas, com base em fatores físicos (relevo, clima, vegetação, solo) e humanos (população, economia, entre outros). Até hoje, muitos estudos técnicos, acadêmicos e nos diversos níveis educacionais consideram essa concepção.
Um dos principais pesquisadores dessa forma de estudo foi o geógrafo estadunidense Richard Hartshome, professor nas universidades de Minnesota (1924-1940) e Wisconsin (1945-1970). Seu legado foi articular a Geografia Geral com a Regional e incorporar o estudo de áreas diferentes da superfície terrestre, delimitadas pelo pesquisador.
A inter-relação de diferentes fatores - como solo, clima, produção agropecuária e mercado consumidor permitiria compreender a área analisada. Esse estudo, que Hartshorne denominou de Geografia Idiográfica, poderia ser feito repetidamente, no mesmo local. Ainda segundo Hartshorne, seria possível comparar o estudo de várias áreas, processo que ele chamou de Geografia Nomotética.
Esses métodos passaram a ser muito úteis para planejamentos e estudos regionais, com desdobramentos em análises estatísticas e no geoprocessamento de informações. As principais publicações de Hartshorne foram A natureza da Geografia (1939) e Propósitos e natureza da Geografia (1959).


Há, portanto, diversas possibilidades de regionalização. Podemos citar algumas: países ricos e pobres; países do Hemisfério Norte e do Hemisfério Sul; por continentes (América, África, Ásia, Europa ou Oceania - vide mapa 1); países de cultura ocidental e de cultura oriental, e assim por diante.
MAPA 1
  É importante lembrar que essas regionalizações são uma criação humana, empreendida por pesquisadores ou por pessoas que habitam o lugar. Mas há algumas dificuldades para regionalizar, já que o mundo não é homogêneo e sofre constantes transformações (leia o boxe).
A região
Durante um longo período muitos a estudaram isoladamente do mundo como um todo. Viam-na como uma entidade autônoma, com aspectos particulares, o que equivalia a dividir o mundo em uma infinidade de regiões autossuficientes, mantendo poucas relações entre si. Mas o mundo mudou e as transformações são cada vez mais intensas e velozes.
A compreensão de uma região passa pelo entendimento do funcionamento da economia ao nível mundial e seu rebatimento no território de um país, com a intermediação do estado, das demais instituições e do conjunto de agentes da economia, a começar pelos seus atores hegemônicos.
Estudar uma região significa penetrar num mar de relações, formas, funções, organizações, estruturas etc., com seus mais distintos níveis de interação e contradição.
Se o espaço se torna uno para atender às necessidades de uma produção globalizada, as regiões aparecem como as distintas versões da mundialização. Esta não garante a homogeneidade, mas, ao contrário, instiga diferenças.
É neste contexto que o estudo da região assume importante papel nos dias atuais, com a finalidade de compreender as diferentes maneiras de um mesmo modo de produção se reproduzir em distintas regiões do globo, dadas as suas especificidades.
Num estudo regional se deve tentar detalhar sua composição enquanto organização social, política, econômica e cultural, abordando os fatos concretos, para reconhecer como a área se insere na ordem econômica internacional, levando em conta o preexistente e o novo, para captar o elenco de causas e conseqüências do fenômeno.
Fonte: SANTOS, Milton. Metamorfoses do espaço habitado. São Paulo: Hucitec, 1988. p. 46-48.
Há, portanto, diversas possibilidades de regionalização. Podemos citar algumas: países ricos e pobres; países do Hemisfério Norte e do Hemisfério Sul; por continentes (América, África, Ásia, Europa ou Oceania - mapa 1)- ; países de cultura ocidental e de cultura oriental, e assim por diante.
Ao estudar países pobres e ricos, por exemplo, o critério adotado é o socioeconômico. Se a regionalização se basear na divisão política, o critério é, principalmente, o território de cada país e suas influências regionais ou globais. Já se levarmos em consideração aspectos como o idioma, a religião e os costumes, essa regionalização será de caráter étnico e cultural - vide mapa 2.
Mapa 2
Durante a Guerra Fria, duas formas de regionalização do espaço mundial foram muito utilizadas:
A divisão Leste X Oeste: criada em função da localização geográfica das superpotências. Tinha no Oeste o bloco de países capitalistas, alinhados aos EUA, e no Leste o bloco de países socialistas, alinhados a URSS. Na Europa se deu a clara materialização dessa regionalização onde existia a chamada "Cortina de ferro" - vide mapa 3, separando a Europa Ocidental da Oriental. Mesmo aqueles países localizados no Oeste que se alinhavam a URSS, eram agrupados no Leste, assim como o inverso também ocorria.
 Mapa 3
Os três mundos: essa regionalização foi criada a partir do artigo escrito por um jornalista francês chamado Alfred Sauvy, no qual o mundo seria como a França antes da Revolução Francesa, dividida em 3 estados. Para Sauvy, o mundo pós-2ª Guerra estaria dividido em três, sendo :
Primeiro mundo: constituído pelos países capitalistas desenvolvidos, como, EUA, Canadá, países da Europa Ocidental, Japão, Austrália e Nova Zelândia.
Segundo mundo: constituído pelos países socialistas, como, URSS, países do Leste Europeu.
Terceiro mundo: constituído pelos países subdesenvolvidos, como, países da América Latina, da Ásia, da África.
Mapa 4
Durante a Guerra Fria, alguns chegaram a falar em um quarto mundo, que seria constituído pelos países mais pobres do mundo de economia basicamente primária, e com profundos e caóticos problemas sociais.
Países do Norte e do Sul: diferente das demais propostas de regionalização, esta não apresenta um autor precursor, mas cabe destacar o presidente dos Estados Unidos, Bill Clinton, como um dos responsáveis pela popularização dessa representação. Após décadas de Guerra Fria, o enfrentamento ideológico entre Socialismo e Capitalismo (Leste x Oeste) perdeu espaço para a disputa econômica entre Ricos e Pobres (Norte x Sul). A idéia ganhou força no início da década de 1990, a partir da dissolução da União Soviética, principal representante do “Segundo Mundo”.
Figura 1
 Com relação a essas representações, deve ficar claro que são simplificações arbitrárias, convenientes para a maior parte da mídia e para os Estados que as endossam. Em nenhum momento o Leste foi totalmente Socialista nem o Oeste plenamente Capitalista. A divisão entre Norte e Sul também é uma representação simbólica, que desrespeita a Linha do Equador. A desigualdade entre Norte e Sul já existia, mas não se evidenciou após a Segunda Guerra Mundial devido ao predomínio da Guerra Fria.
No século XIX, os países europeus realizaram uma verdadeira corrida colonial em direção à África e à Ásia, onde havia imensas porções territoriais ainda desconhecidas por eles. Esse fato pode ser explicado pela crescente industrialização, que por um lado originava as crises de superprodução, obrigando as nações industrializadas a buscar mercados externos para vender excedente, e por outro dependia cada vez mais de novas fontes de matérias-primas.
A regionalização do espaço mundial com base em critérios sociais sempre está ligada ordem internacional que prevalece num certo momento, ao equilíbrio instável dos países e os grupos de países, à disputa (ou cooperação) entre as grandes potências mundiais. Após 1945 o mundo dividiu-se em três "mundos" ou conjuntos de países: o primeiro mundo(países capitalistas desenvolvidos); o segundo mundo (países socialistas ou de economia planificada); e o terceiro mundo (áreas periféricas ou subdesenvolvidas, com freqüência marcadas por disputas entre capitalismo e socialismo).
Para entendermos a regionalização atual, dos anos 90 e início do século XXI, temos que estudar a crise do segundo mundo e como essa crise vem reforçando a oposição entre o Norte e o Sul. 
E, para melhor entendermos, estudaremos sobre a Guerra Fria, pois foi neste período histórico – 1945 a 1991 – que o mundo esteve regionalizado, isto é, dividido, em dois blocos geopolíticos, que contribuiu para a bipolarização do espaço mundial.
Com relação a essas representações, deve ficar claro que são simplificações arbitrárias, convenientes para a maior parte da mídia e para os Estados que as endossam. Em nenhum momento o Leste foi totalmente Socialista nem o Oeste plenamente Capitalista. A divisão entre Norte e Sul também é uma representação simbólica, que desrespeita a Linha do Equador. A desigualdade entre Norte e Sul já existia, mas não se evidenciou após a Segunda Guerra Mundial devido ao predomínio da Guerra Fria.
A regionalização do espaço mundial com base em critérios sociais sempre está ligada ordem internacional que prevalece num certo momento, ao equilíbrio instável dos países e os grupos de países, à disputa (ou cooperação) entre as grandes potências mundiais. Após 1945 o mundo dividiu-se em três "mundos" ou conjuntos de países: o primeiro mundo(países capitalistas desenvolvidos); o segundo mundo (países socialistas ou de economia planificada); e o terceiro mundo (áreas periféricas ou subdesenvolvidas, com freqüência marcadas por disputas entre capitalismo e socialismo).
   Para entendermos a regionalização atual, dos anos 90 e início do século XXI, temos que estudar a crise do segundo mundo e como essa crise vem reforçando a oposição entre o Norte e o Sul.

Mapa 5  
 Portanto, estudaremos sobre a Guerra Fria, pois foi neste período histórico – 1945 a 1991 – que o mundo esteve regionalizado, isto é, dividido, em dois blocos geopolíticos, que contribuiram para a bipolarização do espaço mundial. Mas, para entendermos melhor sobre a ordem bipolar, que marcou o período da Guerra Fria, faz-se necessário compreender o que é ordem geopolítica mundial.

ORDENS GEOPOLÍTICAS MUNDIAIS
A ordem geopolítica mundial é uma forma explicativa utilizada para melhor compreender as transformações socioeconômicas e geopolíticas que ocorreram no mundo. Corresponde, portanto, às relações de poder entre os países, à correlação de forças entre eles no plano mundial. Essa ordem define qual é ou quais são as grandes potências e suas áreas de influência em determinado momento histórico, quais são as disputas ou conflitos que ocorrem nos âmbitos político, militar, ideológico, econômico etc.
Segundo alguns autores, uma ordem geopolítica mundial se caracteriza por uma situação provisória de equilíbrio de forças entre os países e é definida pela atuação de uma potência mundial de destaque no poder (ordem unipolar ou monopolar), duas potências(ordem bipolar) ou várias potências(ordem multipolar).
Identificar a ordem mundial vigente permite compreender a realidade geopolítica em um de­terminado período histórico.
No estudo de geopolítica, costuma-se afirmar que existiram algumas ordens mundiais predomi­nantes em determinados períodos históricos, como a ordem bipolar, característica da velha ordem, e a multipolaridade x unipolaridade, que definem a chamada nova ordem mundial.
VELHA ORDEM MUNDIAL
 Ilustração do interesse econômico britânico e francês por regiões de exploração imperialista.
A velha ordem pode ser dividida em duas fases: a da industrialização, quando a Inglaterra era a maior potência mundial e a fase que se iniciou após a Segunda Guerra Mundial, quando emergiu a ordem bipolar na organização do espaço geográfico, caracterizada pela disputa hegemônica mundial (bélica, econômica, política e cultural). Formaram­-se então dois grandes blocos político-militares, cada qual sob a influência de uma superpotência: uma capitalista, os Estados Unidos, e outra socialista, a então União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS).
Esse processo ocorreu com muitas resistências. A Conferência de Bandung, por exemplo, reali­zada na Indonésia em 1955, reuniu 29 países asiáticos e africanos que não aceitavam a hegemonia norte-americana nem a soviética. Esses países defendiam projetos de cooperação econômica entre os dois continentes. Entretanto, o poderio das duas superpotências se estabeleceu tanto no plano econômico quanto no geopolítico.
Observe o mapa a seguir. Ele mostra como ficou a organização do espaço e a hegemonia mundial com a ordem bipolar.
Mapa 6
Com o fim da Segunda Guerra Mundial, em 1945, a Alemanha foi dividida em quatro zonas de ocupação e, em 1949, foram criadas duas Alemanhas: a República Democrática Alemã (Alemanha Oriental), socialista, com capital em Berlim; e a República Federal Alemã (Alemanha Ocidental), capitalista, com capital em Bonn. A cidade de Berlim, apesar de se localizar no lado oriental, foi dividida ao meio por um muro, em 1961, para impedir a livre circulação dos cidadãos da Alemanha socialista. O Muro de Berlim transformou-se no principal símbolo da Guerra Fria e da ordem mundial bipolar, pois materializava a divisão de dois blocos completamente antagônicos.
Queda do Muro de Berlim - 9 novembro de 1989

A Guerra Fria

Guerra Fria
Cercada de mitos e impregnada de intensa propaganda oficial, a expressão Guerra Fria se baseia numa premissa básica: a partir do fim da Segunda Guerra Mundial, e particularmente a partir de 1949, tamanho era o poderio militar (nuclear) dos Estados Unidos e da União Soviética, que evitavam se destruir, passando a se chocar diplomaticamente e em locais onde não havia risco de conflito nuclear. Esta seria a equação básica para as relações internacionais e, na medida em que O conflito EUA X URSS é ideológico e de aniquilação mútua, o mundo teria de se posicionar entre um e outro,formando áreas de influência e blocos diplomáticos. A verdade oficial, que a propaganda incutia em uma e em outra população, era que enquanto uma nação tentava se defender a outra se expandia, e tudo não passava de uma formidável luta entre a liberdade e a tirania, a defesa da paz contra o expansionismo belicoso.
                 Fonte: BARROS, Edgar Luiz de. A Guerra Fria. 3. ed. São Paulo: Contexto, 1985. p. 5.